Charge para o Jornalistas & Cia
Moacir Japiassu, o Considerado, idealizador do Jornal da Imprença e do histriônico Janistraquis, à época (ano 2000) dirigia a Revista Jornal dos Jornais, que se aproximava de seu segundo ano de vida. Ele convidou Eduardo Ribeiro, pela Mega Brasil Comunicação, para organizar a festa do que seria um novo projeto associado à publicação: o Prêmio Claudio Abramo de Jornalismo.
Amigo e admirador do artista plástico e também jornalista Amílcar de Castro, Japi o convidou para desenhar o troféu do prêmio, o que por si só, por ser Amílcar quem era, já elevaria sobremaneira a relevância do projeto, que, de resto, teve vários patrocinadores importantes.
Amílcar (falecido em 2002) relutou, pois tinha muitas atividades à época, mas acabou cedendo aos apelos de Japi e aceitou a empreitada. A pedido do Considerado, que queria que o troféu simbolizasse uma dupla homenagem (a Claudio Abramo e ao próprio artista, um dos idealizadores da revolucionária reforma gráfica do JB, em 1958), Amílcar, num daqueles lances de genialidade que só os grandes artistas têm, bolou um troféu com as iniciais C e A, que, lidas ao contrário, ficavam A e C. Ou seja, estava ali representada, como queria Japi, a dupla homenagem – C e A de Claudio Abramo e A e C de Amílcar de Castro.
A festa de entrega do prêmio seria – como de fato foi – de gala, com autoridades, empresários e jornalistas saindo pelo ladrão nos salões do Renaissance, em São Paulo, praticamente às vésperas do Natal do ano 2000. O dia era 15 de dezembro. Inesquecível. Japi conseguiu levar para se apresentar na festa o Coral da LVB, que cantou inicialmente o Hino Nacional e depois fechou a festa com uma apresentação emocionante. No meio, entre uma etapa e outra, ainda houve a apresentação do conjunto Nosso Choro, que tinha como atração principal Luís Nassif. O mestre de cerimônias era Chico Pinheiro, da Globo.
Cuidadoso, Japi fez uma rigorosa revisão no texto produzido por Paulo Vieira Lima, à época sócio da Mega Brasil e responsável por parte do cerimonial do evento. Entre as correções que fez, de próprio punho, uma foi o nome de Amílcar, que havia sido digitado erradamente. Paulo recebeu os originais corrigidos, conferiu as mudanças produzidas por Japi e promoveu as alterações necessárias em novo texto, mas, no calor dos acontecimentos, na hora de entregar o roteiro para Chico Pinheiro pôs nas mãos dele a pasta que continha o texto anterior, sem as correções. A tragédia se anunciava.
Alguns dias antes da festa, tínhamos recebido da Editora Jornal dos Jornais a informação de que a escultura estava pronta e precisava ser retirada na fundição que a produzira. Como a empresa ficava na Zona Leste de São Paulo, próxima da residência de Paulo, pedimos a ele que passasse por lá e a trouxesse no dia seguinte. Não sabíamos que a peça era um tanto avantajada, nem que pesava cerca de cinco quilos e muito menos que Paulo a traria de Metrô… em horário de pico! Para completar, fazia um calor infernal na cidade de São Paulo, daqueles de rachar taquara, como se diz no interior.
Paulo chegou bufando, com a camisa encharcada pelo suor que brotava por todos os poros de seu corpanzil de mais de 100 kg. E, com uma irritação explícita, atirou no chão aquela peça fundida e pesada, mesmo sabendo ser uma obra de arte do consagrado Amílcar de Castro, o que fez estremecer o escritório e nossos corações. Não sem antes praguejar: “Vocês são fdp mesmo. É muita sacanagem me fazer carregar de Metrô esse troféu que mais parece uma mola de caminhão! Quase fui linchado. Me senti um estivador carregando ferro debaixo de um sol africano!!“.
Foi uma gargalhada geral, não obviamente pela peça, que tinha de fato a mão do gênio e que, apesar do “tombo”, nada sofreu, por ser muito resistente e também por estar bem embalada, mas pela cena surreal que se desenhara: uma peça de Amílcar de Castro transportada de Metrô pelo sócio-diretor da Mega Brasil e apelidada de “mola de caminhão” – tudo em função da raiva que ele passou por aceitar missão, digamos assim, tão delicada.
Até hoje Paulo nega com veemência que tenha sido vingança, mas o fato de entregar o roteiro errado a Chico Pinheiro foi muita coincidência!!
Mas é claro que a história não acaba aqui.
Na noite de entrega do prêmio, já a postos, auditório lotado, Chico Pinheiro abre os trabalhos, faz os comentários iniciais e segue à risca a programação, até chegar o grande momento, a entrega prêmio. Aí emenda: “O vencedor do Grande Prêmio, além do cheque, vai levar para casa um troféu de valor inestimável, uma obra de arte de um dos mais consagrados artistas plásticos contemporâneos do Brasil. O nosso celebradíssimo ‘Antenor de Castro’”.
Ouviram-se palmas estridentes por todo o auditório, menos no metro quadrado onde, até então lépido e sorridente, estava Moacir Japiassu, que a partir daquele instante, ao ver trocado o nome de Amílcar por Antenor, em plena solenidade, após ter ele próprio revisado o texto e corrigido o erro, ficou furioso.
Sem se dar conta do que havia ocorrido – porque organizador de eventos não consegue respirar e muito menos atinar para certas ocorrências – e ao ver o sucesso que fora toda a premiação, com presenças ilustres, Eduardo dirigiu-se imediatamente a Japi para com ele dividir os “louros da vitória”.
Cercado de amigos que foram parabenizá-lo pela bela festa e pela oportunidade de homenagear o grande Claudio Abramo, ao ver Eduardo pediu licença para seus convidados, levou-o para um canto e o passou uma descompostura fenomenal, pela tal troca de nomes. O detalhe é que, embora fosse o responsável pela atuação da Mega Brasil na festa, Eduardo sequer sabia daquele “pormaior”. Foi pior que jogar um balde de água fria. Todo o brilho e o glamour daquela bela festa ruíram aos olhos de Japi (e também aos meus, a partir daquele instante), por conta da lamentável escorregada.
Chico Pinheiro, que também não reparou no erro, até hoje não deve saber do acontecido.