El ‘entuche’

Antes de mais nada, tem tirinha nova no TopBlog. Confiram!

E, abaixo,  a charge dessa semana para o Jornalistas & Cia.

A história por trás desta charge é a seguinte:

Copa das Américas, 1993, Santiago de Chile. Pelo Estadão, fotografam Orlando Kissner e Fábio Moreira Salles, hospedados num hotel cinco estrelas, junto à Plaza de la Moneda, cujo apartamento transformaram em laboratório.

Eram os tempos heróicos da telefoto e, com duas máquinas emprestadas pela UPI, os fotógrafos montaram um laboratório de revelação no apartamento, com lonas escuras nas janelas, termostato dentro da banheira, para manter a temperatura ideal para os banhos de revelador e fixador, o secador de cabelo para tirar a água das tiras de filmes. E precisavam de incrível paciência para enviar cada foto durante 21 minutos – sete para passar por telefone a lâmina em magenta, outros sete para o cian e mais sete para a lâmina do amarelo –, para então checar na redação, em São Paulo, se não tinha dado xabu, se as três lâminas sobrepostas resultavam numa fotografia aceitável, o que era esperado, mas naquela época não muito provável.

Os fotógrafos ficaram malvistos quando pediram em legítimo portunhol à camareira “uno benjamin para la tomada” e, diante da cara de conteúdo com que a solicitação foi recebida, o Fábio, fã de Gabriel Garcia Marquez no original, fez o famoso sinal americano de “OK” com os dedos da mão esquerda e enfiou repetidamente o indicador da direita no orifício formado, explicando meio desesperado que “necessito de um entuche”, o que levou a arrumadeira a entrar em pânico antes de desaparecer.

Certa feita, quando toda a parafernália de revelação, ampliação e transmissão de fotos foi ligada, a sobrecarga foi tão grande, que caiu o disjuntor do andar e o Fábio, em horário de fechamento, correu sem camisa para a portaria e pediu um outro quarto, com telefone.

O burocrata de plantão disse que “si”, mas teria que esvaziar o quarto ocupado há 15 dias e, é claro, levar todas as malas e equipamento para “la nueva habitación”, para que os fotógrafos pudessem se desincumbir da missão.

O hotel só desistiu de trocar o quarto e concordou em ceder temporariamente um outro, com energia, quando os carregadores abriram a porta do aposento ocupado pelos jornalistas.

“No meio da penumbra, por causa das lonas negras nas janelas, via-se o Orlando, dois metros de altura, com a pele mais branca do que qualquer finlandês, de cuecas e, como um alquimista, misturando colheradas de pó num tanque portátil de revelação”, conta Fábio. “Havia meias secando penduradas no lustre, roupa suja, uma coleção de tanques e de vidros de produtos químicos e, como num filme de horror, uma dezena de tiras de filme penduradas do teto, para secar, dando a impressão de teias de aranha enroladas e, no solo, câmaras, garrafas de refrigerante, teles imensas, caixas de filmes e um emaranhado de fiação, terminando em ‘jacarés’ firmemente agarrados à fiação do telefone”.

O gerente de plantão parou, olhou um segundo de boca aberta aquele inferno, disse que tudo bem, conseguia o quarto solicitado e de repente ficou fluente em portunhol, até entendeu que o “entuche” falado pelo Fábio, correspondia a “enchufe”, e explicou: “es la parte macho de uma conexión eléctrica”. E o Estadão não atrasou o fechamento.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.