Charge para o Jornalistas & Cia
O ano era 1968. O local: Páteo do Colégio – ou, como se escreve hoje, Pátio do Colégio –, região central de São Paulo, bem pertinho da praça da Sé. Foca, promovido de contínuo a repórter, passsei a ser plantonista do jornal Notícias Populares, cercado de jornalistas experientes e que trabalhavam para Última Hora, Diário da Noite, Folha de S.Paulo, Estadão, Diário Popular. O local era a Sala da Imprensa do plantão da Central de Polícia, por onde tinham passado grandes jornalistas da área policial, inclusive o mestre dos ilustradores e criador de Mônica, Cascão e companhia, Maurício de Sousa. Na Central chegavam todas as ocorrências policiais do centro e dos bairros próximos.
Sílvio Nunes, o Spaghetti, era um dos setoristas. Magro, bigodinho fino, meio surdo, sempre de terno e gravata, Spaghetti era respeitado por delegados e investigadores. Trabalhava para o Diário da Noite. Tratava a todos como “caro carissimo” e de hora em hora fazia sua ronda por telefone, ligando para os principais distritos policiais da cidade, pronto-socorros de Hospital das Clínicas e Hospital Municipal, em busca de notícias. Ouvia com dificuldade, mas não admitia.
– Boa noite! Aqui é da Sala da Imprensa da Central. Alguma coisa boa por ai? – perguntava o velho jornalista.
Coisa boa para o Spaghetti e outros setoristas era assassinato, tiroteio com morte, grandes assaltos. Sanpaulino fanático, estava sempre com o rádio colado ao ouvido nos dias de jogos. Quando anotava nomes e endereços de locais de crimes, ou detalhes dos chamados BOs (Boletins de Ocorrências), os colegas sempre checavam porque ele errava na maioiria das vezes. Mas todos faziam o trabalho de rechecagem com satisfação. Spaghetti era uma figura maravilhosa.
Noite de 4ª.feira, Pacaembu lotado, jogavam São Paulo e Portuguesa. A Sala da Imprensa ficava no final do corredor do prédio onde fora a casa da Marquesa de Santos. Sentado à mesa que pertencia aos Diários, cigarrinho na mão direita e rádinho na esquerda, Spaghetti ouvia atentamente o jogo. Eu, no outro canto da sala, falava ao telefone, apurando a prisão de um grupo de arrombadores de cofres.
O delegado de plantão, Israel Alves dos Santos Sobrinho, que era conhecido como doutor Gravatinha, porque usava com seus ternos escuros somente gravata borboleta, aproximou-se da porta e perguntou ao Spaghetti:
– O Zaqueu já chegou?
Zaqueu é Zaqueu Sofia, repórter da Jovem Pan, em atividade até hoje.
Spaghetti não ouviu. O delegado gritou e chamou a atenção do setorista, voltando a perguntar sobre o Zaqueu. A resposta veio rápida:
– Dois a zero para o São Paulo.
O delegado virou as costas e foi embora.
Esse era o Spaghetti, figura lendária da reportagem policial dos anos 60 aos 80. Deixou saudades.
Meu pai foi integrante da equipe de jornalistas policias da Central de Polícia. Muito amigo do Spaghetti e Dona Laura, esposa deste) que “dava plantão” junto com o marido. Era curioso ver aquela portuguesa enorme e Gravatinha, magérrimo, formando uma dupla no mínimo estranha. Doutor Gravatinha também é de minhas recordações, principalmente a história de ajudar alguns pobres coitados que circulavam no centro à época. Meu pai, também dos Diários Associados, além de fotógrafo do Diário da Noite manteve no ar, pela Difusora, talvez o primeiro programa policial jornalístico do rádio.Entrava pontualmente a Meia-Noite e o chavão inicial era “Estes são os fatos, diretamente da central de Polícia. O repórter é este que vos fala, Atlas de Carvalho”. Uma época mágica e muito saudosa!!!